outubro 29, 2023

Passagens duma apresentação cómica

Escreve romances, novelas, contos, crónicas, poesia, escrita experimental e visual, com que vai enchendo pastas no computador, fazendo às vezes pequenas edições de livros.

 

Com pseudónimo, escreve poesia e prosa erótica, pouco recomendável a moralistas e a pessoas demasiado educadas. 


Pinta a acrílico sobre tela, cartão e tecido, tendo a figura humana como tema central. Rostos, corpos vestidos ou despidos povoam a sua pintura. Fascina-o explorar plasticamente aquilo que é pessoa ou gente, em múltiplas formas, poses e atitudes.


Mede 1,76m e pesa 82kg. É careca, não por opção mas por destino, usando boina, boné ou chapéu para se proteger do frio ou do sol. Faz a barba sempre com atraso de dois ou três dias. Usa óculos devido a astigmatismo. Veste mais ou menos o que calha, sem grande exigência ou vaidade.


Quando lhe perguntam Tudo bem? não sabe o que responder, pois não sabe o que é tudo nem percebe o que é estar bem. Quando lhe dizem Santinho!, ao espirrar, responde Só às vezes.


Ajuda regularmente quem lhe é próximo e desenvolve atividades no âmbito do voluntariado cultural, sobretudo relacionadas com pintura ou poesia.


Não se importa nada que digam mal de si, pois sabe que não será aquilo que os outros dizem. Também não precisa que digam bem.


Não tem qualquer apreço por ideologias políticas ou religiosas, por serem elas as responsáveis pelas maiores atrocidades da história da humanidade.


Nunca se sente só porque está sempre acompanhado de si mesmo, com quem se dá muito bem, e dos seus mundos interiores. 


Luz nele alguma tendência para a boa disposição e uma grande vontade de ser útil.


- Sincrónicas e anacrónicas - 

outubro 22, 2023

Já foi quinta


Já foi quinta, na várzea entre Setúbal e Palmela, com casas, árvores, campos cultivados, poço com nora, sistema de rega com um pequeno aqueduto. Agora é uma ruína daquilo que já foi.

- coisas por aí... -

outubro 11, 2023

Sombra na estrada rachada


Num troço de estrada da várzea de Setúbal tirei esta foto à minha sombra, entre sombras de uma árvore e sobre uma racha do asfalto.

- sombras de mim -

 

outubro 03, 2023

O pastor de mau-feitio

Cruzo-me de vez em quando com um pastor e seu rebanho de cabras e ovelhas. Terá cerca de setenta anos e é seco. Parece ter secado ao sol e ao vento de tantas caminhadas. Quando o cumprimento nem sempre retribui, e quando retribui revela mau-feitio. É como é, mas não deixo de o cumprimentar por isso. Há umas semanas vimo-lo, eu e a minha mulher, de canadianas com o seu rebanho. Impressionou-nos a imagem dum pastor a conduzir o seu rebanho de canadianas, claramente debilitado. A minha mulher perguntou-lhe o que tinha, ele respondeu tratar-se de problemas de coluna. Desejámos-lhe melhoras e ele agradeceu. Depois dessa ocasião vimo-lo mais uma meia-dúzia de vezes à distância, e com as canadianas. Entretanto, passaram semanas sem o vermos e eu questionava se ele teria ficado sem capacidade de conduzir o seu rebanho. Mas há dias, ao final da tarde, demos por ele, ainda de canadianas, mais magro e de andar mais débil. Vinha na nossa direção, com três cães que, de imediato e com precisão, reagiam às suas indicações de assobios e de poucas palavras. Vai à frente!, Olha aquelas!, Vai lá, vai! Em correrias frenéticas, os cães seguravam o avanço do rebanho para que não se afastasse muito do pastor. Parámos para que, mais próximos, lhe pudéssemos falar. Como tem passado?, perguntou a minha mulher. O problema das costas está na mesma, mas agora estou com outro que me preocupa mais, respondeu com ar pesado. O que é?, perguntei. O homem balbuciou um pouco e hesitou na resposta. Encostou a mão ao peito, respondeu É aqui, soltou um choro breve que logo controlou e concluiu, Assim que chegar a casa vou para o hospital. Oh, caramba!, disse eu quando ele já me virava as costas, As melhoras! Não agradeceu, continuou o seu caminho e eu fiquei a pensar se seria aquela a última jornada do pastor de mau-feitio.

- do projeto Sincrónicas e anacrónicas -