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dezembro 01, 2024

Este cientista... - Adília Lopes

Este cientista diz que tem de preencher o currículo. Anda a comer este e esta. É topa tudo. O que quer é tacho e penacho. Nem é sinistro, é vulgar. No laboratório faz experiências com um pouquinho da Índia. Há um fogo no laboratório. Quem é que eu salvo? O porquinho da Índia amoroso ou o cientista manhoso?

Texto do livro Choupos, de Adília Lopes, da editora Assírio e Alvim
- Textos doutros autores -

julho 31, 2024

Ditirambo - Miguel Torga

É o amor que me inspira.
Amo a vida, esta bela prostituta.
Esta mulher tão pura e dissoluta
No mesmo instante,
Que não dá tréguas a nenhum amante.

Amo-a, e canto esse gosto renovado
De uma grande paixão sobressaltada.
Dum leito de soluços e suspiros
Misturados
Ergo a voz e celebro
Os sublimes deuses
Que, divinos, me deram
O bem humano que nunca tiveram.

- Textos de outros autores -

maio 28, 2024

A vida avança - Su Dongpo

A vida avança, é tempo de decisões
Será melhor ainda este infatigável labor
Ou o repouso e a paz?

Por que não meter as mãos dentro das mangas
E, preguiçosamente, olhar apenas
O perpassar dos dias?

Que a saúde nos acompanhe num incerto porvir
Tranquilidade nos anos que nos restam
O prazer de uma taça de bom vinho

Excerto dum poema de Su Dongpo, poeta chinês do séc. XI.

- textos doutros autores -

abril 08, 2024

Ilusão - E. M. de Melo e Castro

Por que escrever se poucos sabem mesmo ler?
Por que ler se poucos sabem mesmo escrever?

Para que quem escreve... lê?
Para que quem lê... escreve?

Porque escrever e ler se enroscam 
Eroticamente um no outro
Como não sei que nem como
Para fazerem um novo ser
Que não tem nome nem razão
Senão a desrazoável ilusão
De escrever e ler

- textos doutros autores -

março 16, 2023

Preciso de sentimentos - Alda Merini

Eu não preciso de dinheiro
Preciso de sentimentos
De palavras, palavras sabiamente escolhidas
De flores chamadas pensamentos
De rosas chamadas presenças
De sonhos que habitam as árvores
De canções que fazem dançar as estátuas
De estrelas que murmuram aos ouvidos dos amantes

- Textos doutros autores - 

julho 08, 2022

O irracional, o bem e o mal - Milan Kundera

Porquê a Alemanha ontem e a Rússia hoje querem dominar o mundo? Para serem mais ricas? Mais felizes? Não. A agressividade da força é perfeitamente desinteressada; imotivada, só quer o seu querer; é o puro irracional.

O homem deseja um mundo em que o bem e o mal sejam nitidamente discerníveis, porque nele há o desejo, inato e indomável, de julgar antes de compreender. Sobre esse desejo são fundadas as religiões e as ideologias.

Excertos do livro A arte do romance, de Milan Kundera, Círculo de Leitores, 

- textos doutros autores -

maio 18, 2022

Lamentando o destino - Bocage

Apenas vi do dia a luz brilhante
Lá de Túbal no empório celebrado
Em sanguíneo caráter foi marcado
Pelos Destinos meu primeiro instante

Aos dois lustros a morte devorante
Me roubou, terna mãe, meu doce agrado
Segui Marte depois, enfim, meu Fado
Dos irmãos e do pai me pôs distante

Vagando a curva terra, o mar profundo
Longe da Pátria, longe da Ventura
Minhas faces com lágrimas inundo

E enquanto insana multidão procura
Essas quimeras, esses bens do mundo
Suspiro pela paz da sepultura

- textos outros autores - 

agosto 22, 2021

A beleza das coisas - Alberto Caeiro

        Às vezes, em dias de luz perfeita e exata, 
        Em que as coisas têm toda a realidade que podem ter, 
        Pergunto a mim próprio devagar 
        Por que sequer atribuo eu 
        Beleza às coisas. 

        Uma flor acaso tem beleza? 
        Tem beleza acaso um fruto? 
        Não: têm cor e forma 
        E existência apenas. 
        A beleza é o nome de qualquer coisa que não existe 
        Que eu dou às coisas em troca do agrado que me dão. 
        Não significa nada. 

        Então por que digo eu das coisas: são belas? 
        Sim, mesmo a mim, que vivo só de viver, 
        Invisíveis, vêm ter comigo as mentiras dos homens 
        Perante as coisas, 
        Perante as coisas que simplesmente existem. 

        Que difícil ser próprio e não ver senão o visível! 

- textos doutros autores -

junho 11, 2021

Mamíferos - Jesús Lizano

Eu vejo mamíferos.
Mamíferos com nomes estranhíssimos.
Esqueceram-se que são mamíferos
e creem-se bispos, canalizadores,
leiteiros, deputados. Deputados?
Eu vejo mamíferos.

Polícias, médicos, porteiros,
Professores, alfaiates, cantautores.
Cantautores?
Eu vejo mamíferos…

Presidentes, criados, escriturários, mestres d´obra.
Mestres d´obra!
Como pode crer-se mestre d´obra um mamífero?
Membros, sim, membros, creem-se membros
do comité central, da ordem dos médicos…
académicos, reis, coronéis.
Eu vejo mamíferos.

Atrizes, putas, assistentes, secretárias,
diretoras, lésbicas, puericultoras…
Na verdade, eu vejo mamíferos.
Ninguém vê mamíferos,
ninguém, ao que parece, se lembra que é mamífero.
Serei eu o último mamífero?
Democratas, comunistas, xadrezistas,
jornalistas, soldados, camponeses.
Eu vejo mamíferos.

Marqueses, executivos, sócios,
italianos, ingleses, catalães.
Catalães?
Eu vejo mamíferos.

Cristãos, muçulmanos, coptas,
inspetores, técnicos, beneditinos,
empresários, caixeiros, cosmonautas…
Eu vejo mamíferos.

poema traduzido por Carlos d'Abreu

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