agosto 30, 2022

Camaleão voador

Perto do pôr-do-sol andava junto do rio da minha cidade, porque me apetecia andar e porque me sabia bem apanhar ar fresco. Pus-me a pensar, então, qual seria a banalidade que iria registar neste dia. Claro que ainda faltavam algumas horas para o dia terminar e que muita coisa poderia acontecer. Pus-me a olhar para o rio, sempre tão azul, e para as nuvens, com cores e formas tão diferentes. Um arco-íris descontínuo passava dum lado para o outro do rio. Então reparei naquilo que daria origem à banalidade de hoje. Uma nuvem, mais branca do que as outras, com forma de camaleão de boca aberta, avançava lenta para poente. Curiosamente, estava a entrar na porção mais baixa do arco-íris, logo acima da estreita península do outro lado do rio. Achei piada à semelhança entre a nuvem e o bicho, apenas algo disforme do lado do rabo. Passados dois ou três minutos voltei a olhar, mas da nuvem restavam apenas uns farrapos dispersos e disformes; e também o pedaço de arco-íris havia desaparecido. Concluí que o camaleão voador havia comido as cores do arco, que o haviam feito desintegrar em farrapos de nuvem que, passados mais uns minutos, desapareceram por completo. Deve ser por comerem arco-íris que os camaleões adotam todas as cores. 

- do projeto Anuário de banalidades

agosto 27, 2022

Musa da tragédia


Musa da tragédia - Acrílico sobre tela 

- Nus e seminus -

agosto 22, 2022

Às vezes turva-se-me a vista

Às vezes turva-se-me a vista. Umas vezes por cansaço, outras por indecisão. Outras vezes por qualquer outra coisa que não sei o quê. Turva-se-me de modo que não consigo, mesmo que me esforce, ver as coisas em pormenor. Parece-me que é o cérebro que está turvo em vez dos olhos. Mas um turvo que me permite captar aquilo que vejo num todo. A vista deixa de fracionar e de selecionar as coisas. Vejo tudo num todo e sinto-me parte dele. A cabeça fica descansada e inativa (ou aparentemente inativa) como desejo tantas vezes. Raras vezes me acontece. Mas é nessas vezes que, estando de parte a minha vontade, fico mais próximo de mim.

- do projeto Três, dois, um -

agosto 17, 2022

Pequenos detalhes religiosos

Ela era muito CARENTE. Perdeu o A e passou a ir à missa todos os domingos.


É tão beata que todos os dias tira o C do CORAÇÃO.


Era CRISTÃO. Trocou o C por um T e ficou algo deprimido.


Saiu da MISSA com fome. Trocou o I por um A e ficou satisfeito.


Gosta tanto do padre que quando ORA acrescenta um C.


O PADRE trocou o A por um O e começou a cheirar mal.


- do projeto Palavras Prenhas

agosto 12, 2022

Escrevo de mim

Não escrevo para os outros, nem para mim. Escrevo de mim, pois de outro modo não sei. 

- Frases soltas -

agosto 09, 2022

Árvore amputada


Esta árvore, ou melhor, isto que resta duma árvore está ao fundo da Avenida de Angola, em Setúbal. Até há pouco tempo era uma árvore luxuriante e saudável, agora é o que se vê, com as suas folhagens e ramos reduzidos a cerca de um décimo. Está num espaçoso relvado onde não punha nada nem ninguém em perigo. Quem souber da razão de ser desta poda-amputação-quase abate diga-me. O meu contacto está aí, na coluna da direita. E quem achar, como eu, o quão disparatado é, pegue na foto, envie-a à Câmara Municipal de Setúbal e ou à União de Freguesias de Setúbal e mostre o seu desagrado pelo sucedido.

- coisas por aí - 

agosto 05, 2022

Entre troncos


Esta fotografia foi tirada há sete meses, num passeio pela Várzea de Setúbal, num pequeno troço onde há enormes ciprestes, com troncos bem verticais. Nela está a minha sombra entre as sombras de dois deles.

- Sombras de mim -

agosto 02, 2022

Figura da Paixão - Rafael Bordalo Pinheiro


Esta é uma das dezenas de figuras, de barro policromado e em escala próxima da humana, que fazem parte da Paixão de Cristo, obra de Rafael Bordalo Pinheiro exposta no Museu José Malhoa, nas Caldas da Rainha.

- outras artes -