julho 28, 2022

Escravos do cigarro

Confesso que me faz muita impressão ver gente a fumar, e mais ainda quando o fumo me chega ao nariz. No que respeita ao tabaco, acho muito estranho várias coisas, que transponho para diversas perguntas: por que se fuma?, por que se fuma se o fumo faz tão mal?, por que fuma este e não aquele?, por que é tão difícil deixar de fumar?, por que é que tanta gente não consegue deixar de fumar?, que sentido faz estar constantemente a chupar um cigarro?, que sentido faz estar constantemente a introduzir fumo nos pulmões e veneno no organismo? Há as questões do vício, da adição, eu sei; mas parece-me sobretudo serem as fraquezas pessoais que levam a essa autoescravização. Não é o fumador que escolhe se e quando vai fumar, é o cigarro que diz ao fumador quando ele tem de ir fumar (e fá-lo frequentemente). E é estranho ver tanta gente a andar permanentemente ao ritmo das chamadas do tabaco. À trela do cigarro, no fundo, sem capacidade para lhe desobedecer.

- do projeto Entre deuses e diabos -

julho 24, 2022

Rapariga com chapéu e limão


Rapariga com chapéu e limão - acrílico sobre cartão, 100x70

- Nus e seminus -

julho 19, 2022

Do paraíso ao inferno

O paraíso e o inferno estão muitas vezes ao nosso lado. Durante os tempos duros do confinamento, habituei-me a fazer trajetos regulares a pé pelas imediações: pela Várzea, junto a um campo de sobreiros, quintas e horta dos prisioneiros; pela estrada da lagartixa, que vai por um pequeno vale ao lado duma ribeira, entre o monde de Palmela e a serra dos Gaiteiros, tão verdejante; às vezes seguia daí pelo vale dos Barris ou ia até à crista da serra do Louro, ponteada de moinhos, alguns em bom estado, um deles em funcionamento; pela estrada da jibóia, que vai para o alto dos Gaiteiros, por meio de arbustos altos e pinheiros mansos de largas copas; pela estrada romana (assim lhe chamam, mas é medieval, feita pelos mouros), que vai para o castelo de Palmela, de onde se pode ver tudo o que descrevi antes, além de Setúbal e o Sado a sul, e de Lisboa e o Tejo a norte. Pela estrada da cobra, que passa perto do castelo, nunca me meti a pé, pois por lá passam regularmente automóveis que levantam muita poeirada branca que suja e dificulta a respiração. São estradas de terra batida (menos a medieval, que é um caminho pedestre com partes calcetadas) que partem todas da Baixa de Palmela, onde moro, e passam por recantos que são pequenos paraísos. O velho Jaquelino, que tem uma terreno de dez hectares no meio da zona mais verdejante, e que lá passa muitos dos seus dias, a limpar, cavar, regar e a afugentar os javalis, diz, com a sua voz rachada mas com timbre de paixão Isto é um pequeno paraíso, não é? Pois, esse pequeno paraíso transformou-se num inferno, que não direi ser pequeno. Numa tarde ardeu toda a vegetação que acabei de descrever, à exceção da Várzea, onde o fogo não chegou. Devido a uma intervenção cirúrgica dos bombeiros, as casas habitadas foram todas poupadas pelo fogo, que andou a uma centena de  metros da minha. A coisa esteve muito feia para algumas habitações, de onde os moradores tiveram de sair, por sugestão da proteção civil. Eu e a minha mulher saímos também, por sugestão minha, e passámos a noite no meu ateliê, em Setúbal, a seis quilómetros de casa. O final de tarde e princípio da noite estavam incertos e jogámos pelo seguro, antes que a povoação ficasse cercada pelo fogo ou todos os acessos fossem cortados. Mas, já controlado, de noite o fogo já não progrediu mais. Agora olha-se para aqueles vales e encostas e está tudo queimado, preto de carvão, cinzento e branco de cinza. E agora? Como e quando se repõe aquela vegetação, tão rica de tanta coisa de que não sei os nomes? E os animais que ali viviam, que é feito deles?: javalis, texugos, saca-rabos, cobras, lagartos, lagartixas, ratos, abelhas, grilos, rãs, sapos, ouriços, etc., etc. E os cavalos e os burros da quinta onde os havia, ter-se-ão salvo? E o que se passará na alma de quem cuidava destes recantos e os conhecia desde criança? Nos últimos encontros que tive com o Jaquelino, ele disse-me que quando quisesse podia entrar na quinta e ir vê-la, encostas acima e abaixo. Não cheguei a fazer isso, ficando sempre na estrada a falar com ele, às vezes bem longe de mim. Hei de ir ter com ele, pois certamente estará lá, no carvão e nas cinzas da sua quinta, a fazer com que volte a ganhar vida, uma vida que a sua já não permitirá ver. E vou querer ajudá-lo, entrando finalmente, não no seu pequeno paraíso fresco e colorido, mas num inferno, escuro e sem vida.

- do projeto Sincrónicas e anacrónicas -

julho 15, 2022

Fui apanhado

O vírus do covid-19 apanhou-me, dois anos e meio depois de andar a fazer estragos pelo país e de eu andar a tentar escapar-lhe. Passou-mo a minha mãe, sem que se soubesse que ela estava infetada. Ela esteve quatro noites no hospital, prostrada, quase em coma, com febre que chegou aos 40 graus. Eu tenho estado a passar os dias entre a casa e o ateliê, sem me encontrar com ninguém, como mandam as regras. O que eu tenho é tosse, tosse e tosse, mais nada. Dói-me a garganta e estou rouco. Quando espirro parece que passam pedaços de vidro pelas goelas. Hoje, quatro dias depois dos primeiras tosses, parece que a coisa está a abrandar. Veremos...

- do projeto Sincrónicas e anacrónicas -

julho 10, 2022

Salinas de Rio Maior


Deparar com salinas no interior do país é uma visão inesperada. Mas ei-las, em Rio Maior, resultado de nascentes de água salgada, que ali são exploradas pelo menos desde o tempo dos romanos.

- Coisas por aí - 

julho 08, 2022

O irracional, o bem e o mal - Milan Kundera

Porquê a Alemanha ontem e a Rússia hoje querem dominar o mundo? Para serem mais ricas? Mais felizes? Não. A agressividade da força é perfeitamente desinteressada; imotivada, só quer o seu querer; é o puro irracional.

O homem deseja um mundo em que o bem e o mal sejam nitidamente discerníveis, porque nele há o desejo, inato e indomável, de julgar antes de compreender. Sobre esse desejo são fundadas as religiões e as ideologias.

Excertos do livro A arte do romance, de Milan Kundera, Círculo de Leitores, 

- textos doutros autores -

julho 06, 2022

Paulo Valente


O Paulo é amigo de longa data. Presença simpática e sábia no seu ofício de barman, e não só. É o rosto do La Bohème, bar que existe há mais tempo em Setúbal, no mesmo local e de forma ininterrupta (desde 1989). Tirei-lhe esta fotografia há dias, aquando da apresentação do seu segundo livro de poesia, Serenador de horas, vol. 2, que aconteceu lá, no bar, rodeado de amigos e frequentadores assíduos.

- Pessoas -

julho 01, 2022

BBBF - Slam Allen


Momentos inesquecíveis foram vividos há dias na 11.ª edição do Baixa da Banheira Blues Fest, durante a atuação de Slam Allen. Um senhor!, com domínio perfeito do palco e da plateia. E da rua, já que no dia seguinte andou a tocar pelo relvado do parque José Afonso. Com uma voz fantástica, um domínio perfeito da guitarra elétrica e sempre (sempre!) com um sorriso, tocou temas seus e clássicos dos blues, do soul e do rock. Ele cantou, tocou, falou, circulou pela plateia, sentou-se, deitou-se, ofereceu palhetas às crianças, apertou e beijou mãos... Para dizer mais as palavras não chegam.

- Outras artes -